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domingo, 6 de março de 2022

... A velhice pede desculpas ...




                                 Poema de Cecília Meireles

Tão velha, 
estou como árvore no inverno,
vulcão sufocado, pássaro sonolento.
Tão velha estou, de pálpebras baixas,
acostumada apenas ao som das músicas,
à forma das letras.

Fere-me a luz das lâmpadas, o grito frenético
dos provisórios dias do mundo.
Mas há um sol eterno, eterno e brando
e uma voz que não me canso, muito longe, de ouvir.

Desculpai-me esta face, que se fez resignada,
já não é a minha, mas a do tempo,
com seus muitos episódios.

Desculpai-me não ser bem eu,
mas um fantasma de tudo.
Recebereis em mim muitos mil anos, é certo,
com suas sombras, porém, suas intermináveis sombras.

Desculpai-me viver ainda,
que os destroços, mesmo os da maior glória,
são na verdade só destroços, destroços.




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