Após o chá da tarde, sobre a mesa da varanda,
a Xícara e o Bule começaram a conversar.
A Xícara muito vaidosa, disse para o Bule:
- Ah... eu sou a mais bela peça da copa!
O Bule respondeu:
- Tu? Ora essa!
Indignada a Xícara retrucou:
- Sim! Sou a mais bela peça,
e a mais importante também!
Com ironia o Bule falou:
- É mesmo?
Zangada a Xícara disse:
- Podes rir, Bule velho!
E o Bule que ainda tinha um pouco de chá,
amigavelmente falou:
- Ora, não me leve a mal.
Tu sabes que eu gosto muito de ti.
Mas a Xícara, ignorando o Bule,
continuou a discorrer amorosamente
sobre as suas qualidades admiráveis:
- Pois então.
É a mim que os senhores levam à boca,
todos os dias, e me cobrem de beijos
enquanto bebem o chá.
Sou feita de porcelana delicada,
com belas florzinhas pintadas de dourado,
que refletem a luz e brilham como num sonho.
Não é qualquer um da casa que pode me tocar.
O Bule, muito sensato, tentou transmitir uma lição:
- Minha amiga, o que realmente importa é o nosso destino.
O que disseste sobre tuas florzinhas é somente vaidade,
mas ir à boca dos senhores é o teu dever.
E sou eu que fervo a água e preparo o chá no meu interior,
o qual é servido por ti.
Tal é o meu destino.
Tu percebes que nós dois, juntos,
temos cada um a sua importância e sentido na vida?
A Xícara riu, e disse com desprezo:
- Oh, sim!
Então não sou diferente
dos copos de vidro grosseiro
que as crianças usam para beber?
Escuta, filósofo, serei franca contigo:
- Tu tens inveja...
Disse o Bule:
Inveja???... Eu ??? ...
Respondeu a Xícara:
- Sim. pois eu estou sempre cheirosa e doce,
e tu tens cheiro de bule velho e borra de chá.
Lavam-me cuidadosamente,
e guardam-me no armário de vidro,
junto com as louças finas e os cristais,
para embelezar a casa.
Enquanto tu és lavado com palha de aço
e te escondem debaixo da pia, para que não te vejam.
Sou estimada, e quanto mais velha eu me torno,
mais valiosa fico.
E tu?
És velho, manchado, cheio de amassadinhos,
e és feito de metal...
O Bule ia responder alguma coisa, porém desistiu.
Como poderia argumentar
com uma Xícara vaidosa e pretensiosa?
Nesse momento o gato da casa, inesperadamente,
pulou em cima da mesa da varanda tentando caçar um besouro.
O gato foi tão rápido e desastrado
que nem escutou os gritos do Bule e da Xícara:
- Cuidado !!!
Mas era tarde demais, e os dois caíram no chão.
O Bule, que tinha uma base pesada,
caiu e rodou como um pião, ficando em pé quando parou.
E a bela Xícara, pobrezinha,
espatifou-se no chão da varanda.
Uma lágrima de chá
deslizou suavemente pela fronte do Bule,
enquanto observava a pequena luz de vida que aos poucos desaparecia dos caquinhos de porcelana.
Entristecido o Bule murmurou:
Minha querida Xícara você escarneceu dos meus amassadinhos.
Mas eles são as marcas da experiência,
dos muitos tombos que levei na vida...
E a soberba Xícara, definhando, respondeu num fio de voz:
- Sem essa, convencido!
Se não fosse o meu fim, tu não terias a oportunidade
de ficar aí, fazendo pose de sábio!...
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