Era uma vez um lenhador
que morava perto de um ribeirão caudaloso,
piscoso e de muita correnteza
que margeava a beiradinha da mata
onde ele tirava lenha para vender e sobreviver com a sua família.
Assim que o atravessava já estava no seu serviço diário.
Num certo dia ele vinha do trabalho,
lá pelas, quase seis horas,
ao atravessar o riacho escorregou na pinguela
que transpunha o pequeno ribeirão e caiu na água.
A correnteza o arrastou até mais embaixo.
Como vinha com a sua ferramenta de trabalho ao ombro,
o machado caiu e foi para o fundo do riacho.
Nem pode saber ao certo onde a ferramenta caíra.
Nadou e saiu do lado que dava para o caminho de sua casa.
Todo molhado, sentou a beira do córrego
e pôs-se apensar como faria para ter seu machado de volta,
pois era o único que tinha.
Sem achar jeito para dar buscas, começou a lamentar-se.
E agora como farei?
Já é quase noite,
e com certeza a correnteza durante a noite
cobrirá meu machado de areia e nunca mais o terei.
Meu DEUS e agora?
O pobre lenhador parecia uma criança
quando perde seu brinquedo.
Mas ele tinha toda razão, ficou quase em prantos.
Resolveu ir embora, estava desolado,
e quando se levantou ouviu um rumor nas águas
que pareciam vir para o seu lado.
Espiou e tal não foi o seu espanto?
Aparecera na superfície das águas
uma figura estranha a seus olhos,
a de uma mulher dos cabelos compridos.
Uma figura linda, mas só a metade dela
aparecia sobre as águas.
Braços longos, anéis nos dedos, tudo reluzentes.
No pescoço tinha um colar brilhante.
O olhar era delicado e amistoso.
Ante aquela aparição que nunca vira antes,
o lenhador ficou sem fala,
só olhando aquele ser que saiu da água.
Ela rompeu aquele silêncio
que dominava aqueles instantes em que um fitava o outro.
Perguntou ao lenhador:
- O que aflige o senhor que está tão triste e reclamando tanto?
Ouvi seus lamentos e vim ver se posso lhe ajudar.
O que aconteceu?
Ele respondeu com certo receio:
- É que eu vinha do serviço, escorreguei na pinguela,
e o meu machado caiu n’água e não tenho como recuperá-lo!
É a ferramenta do meu ganha-pão para a família,
minha esposa e um monte de filhos.
Estou sem saber o que fazer agora e já é quase noite!
Por isso que estava reclamando da sorte!
Ela sorrindo disse-lhe:
- Espere um pouquinho que já volto!
Mergulhou na água e ele pode vê-la,
era a metade mulher e a outra metade era peixe.
Mas ficou quietinho, pois já ouvira falar naquela coisa,
só que antes nunca tinha visto.
Daí a pouco ela saiu e com um machado nas mãos,
era de ouro por inteiro,
aquilo reluzia á seus olhos de tão lindo.
Perguntou-lhe:
- É este o teu machado?
O lenhador na sua simplicidade e sinceridade respondeu:
- Não, não é esse não!
Ela some nas águas e sai de novo em instantes
com outro machado em mãos, só que este era de prata,
reluzia do mesmo modo do primeiro.
Pergunta-lhe outra vez:
- É este?
O lenhador diz:
Não, não é esse também não!
Ela deu o terceiro mergulho e de lá do fundo das águas
surge com o seu verdadeiro machado,
o de ferro com cabo de madeira.
Interpela-o pela terceira vez.
- É este o seu machado?
- Sim, sim é este mesmo moça!
Feliz disse a ela:
- Dê cá este danado
que agora não o deixarei cair mais, no riacho.
Ela passou-lhe a ferramenta
e pediu que ele esperasse só mais um pouquinho.
Foi lá no fundo d’agua e trouxe os outros dois,
o de ouro e o de prata e lhe deu de presente
como recompensa pela sua honestidade.
Ela percebeu que no coração do lenhador
não havia ganância e nem malícia!
Ele agradeceu muito a moça,
e foi-se feliz da vida para sua casa.
No dia seguinte amanheceu contando para a vizinhança
o que acontecera com ele.
Dizia que não precisaria mais trabalhar tanto como antes,
pois ficara rico.
Um dos seus vizinhos ouvindo sua história,
já arquitetou um plano.
Fingindo que tirava lenhas,
passando pelo riacho no mesmo lugar do vizinho
fingiu cair, jogou seu machado n’água
e sentou-se na margem do riacho,
e pôs-se a lamentar.
Meu DEUS e agora que faço?
Perdi meu machado!
Como vou viver sem ele?
Como ficará minha vida sem minha ferramenta?
Vou comer o que?
Se é com ela que ganho meu sustento?
Não demorou, as águas balançaram e a sereia apareceu:
O que foi homem, que está lamentando tanto
que de lá do fundo das águas ouvi suas lamentações?
- É que perdi meu machado aí nas aguas,
e não consigo tirá-lo para amanhã trabalhar na mata.
Vivo de tirar lenhas, adiantou o homem.
A sereia deu um mergulho e saiu de lá do fundo do riacho
com um machado de ouro, e outro de ferro,
justamente o dele e perguntou-lhe:
- Qual dos dois é o seu machado?
Pois são os únicos que encontrei lá no fundo!
- Sim, sim é este de cá, este amarelinho reluzente,
referindo-se ao de ouro, é este mesmo, moça.
A sereia olhou longamente para o homem, deu de ombros,
mergulhou nas águas, com os dois machados,
e não mais voltou.
Sem graça, cabisbaixo, o homem foi-se embora,
até sem o seu machado de ferro!
tudo perde.